(Da Carta francesa)
- "Não vemos bem a utilidade do dever de sentar-se. Temos por costume dizer-nos imediatamente, espontaneamente, o que pensamos."
- "O que nos interessa, o que nos preocupa, dizêmo-lo naturalmente, na primeira ocasião, sem esperar. Então o dever de sentar-se parece-nos artificial."
Quando as Equipes de Nossa Senhora lhes propõem como "ponto concreto de esforço" encontrar-se a cada mês para o tempo de um verdadeiro diálogo conjugal, sob o olhar de Deus (dever de sentar-se), muitos jovens casais dizem: o diálogo faz parte de nossa vida desde que nos conhecemos! É justamente essa comunicação que mais valorizamos! Não é um dever, é uma necessidade!
As primeiras gerações das Equipes reconheceram no dever de sentar-se um meio eficaz para suscitar a troca de idéias e desenvolver a comunicação. A educação recebida, o costume de calar suas reações mais íntimas, o medo de abrir-se dificultavam muitas vezes a expressão dos sentimentos, a partilha das preocupações e das aspirações, a elucidação dos mal-entendidos. Esse diálogo mensal fez com que muitos descobrissem o valor da palavra partilhada, criadora de comunhão.
Ora, um outro tipo de educação, uma grande liberdade de expressão em família, o costume de longas discussões entre jovens, a importância dada a afetividade e a comunicação no casamento, tudo isso criou um estilo de casal em que é indispensável poder-se partilhar tudo, dizer-se tudo. A troca não é mais uma paciente vitória sobre o mutismo, está subentendida desde o início!
Não deve portanto causar surpresa que o dever de sentar-se não provoque o entusiasmo nos jovens casais de hoje, que não percebem, de imediato, sua utilidade.
No entanto, o dever de sentar-se nunca foi um simples processo para facilitar a comunicação entre os esposos. Nem mesmo para fazer-se o balanço sobre "o que vai bem" e "o que não vai bem". Está a serviço do amor conjugal. É um instrumento de ajuda mútua entre marido e mulher para melhor perceberem os apelos do Senhor, para melhor enfrentarem suas responsabilidades.
Amar-se melhor
Mesmo que se tenha o costume de "dizer-se tudo", "espontaneamente", será mesmo supérfluo esse diálogo conjugal metódico que é o dever de sentar-se? Não basta falar para dialogar. Quem "fala pelos cotovelos" pode perfeitamente entrincheirar-se em si mesmo. O que partilhamos realmente nessas trocas feitas ao sabor da ocasião? Até onde vai a abertura, a comunhão? Há muitas maneiras de se ficar na superfície dos problemas, de permanecer em posições tacitamente estabelecidas, de deixar as coisas seguirem seu rumo, de escamotear aquilo que poderia levar a um questionamento e a uma necessária conversão. . . Pode-se falar sem nada dizer e pode-se falar precisamente para evitar que o problema seja colocado em plena luz.
Dialogar diante de Deus implica a vontade de "fazer o jogo da verdade", na lealdade e no respeito mútuo. D:ante de Deus, falar é também, e talvez, primeiro, ouvir. Dizer espontaneamente e logo o que se pensa pode ser um meio de não se dar ao trabalho de ouvir o que o outro tem a dizer. Acaso não comporta o diálogo uma parte de silêncio para permitir que o outro se expresse verdadeiramente? Para permitir que diga até o fim o que tem a dizer - o que talvez esteja tendo muita dificuldade em traduzir em palavras e que pode ser muito profundo, muito importante, embora ainda confuso -o que pode ser doloroso, carregado de inquietação, de dúvida - o que pode ser um surdo apelo por compreensão, por ajuda- ou ainda a tímida expressão de uma esperança, de uma aspiração espiritual, de uma busca de Deus? O diálogo não é feito somente de palavras. É atenção às hesitações, aos silêncios, ao "não dito". . . ao que é o outro, à sua busca, ao seu mistério pessoal ...
Melhor ajudar-se
"Dialogar diante de Deus" é uma forma de oração, é entregar-se à ação do Espírito, é deixar que o Senhor transforme o olhar com que vemos o outro num olhar benevolente, cheio de atenção confiante, de esperança, inspirado na caridade. É buscar juntos o que Deus quer para nós como casal - o que Ele nos chama a ser, o que nos convida a viver. Há o vastíssimo campo dos trabalhos profissionais, das responsabilidades sociais, dos engajamentos na Igreja, das amizades. Obviamente, e felizmente, podemos abordar tudo isso na volta do trabalho, enquanto preparamos a refeição, nos momentos de intimidade - assim como a oração pode brotar das atividades mais familiares. No entanto, como a própria oração, acaso não necessita esse d'álogo de tempos fortes, de momentos privilegiados? Acaso não será preciso ir além do hábito, da espontaneidade, para encontrar-se em plenitude na intimidade do Senhor, acolhido na fé e na oração?
Yves Le Chapelier
(fonte: Carta Mensal das Equipes de Nossa Senhora - ENS-CM-1981-4)
ENS Piabetá - Vivência diária dos Pontos Concretos de Esforço - 03/02/2017
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